não é bem cansaço de correr

Depois de vários dias com este cansaço nas pernas começo a suspeitar que isto está mas é relacionado com as viroses ou com outro factor (depressão? stress?) especialmente depois de ler no Lore of Running sobre o post viral syndome cujos sintomas se prendem com fraqueza muscular e cansaço.

Este sábado corri apenas 2km descalço com o carrinho pela praia e ciclovia. Não morri, mas não me senti “livre”. Hoje a vir de bicicleta senti cansaço exagerado nas subidas. O facto de sentir o cansaço na bicicleta quando estive uma semana sem correr a andar muito moderadamente faz-me eliminar a própria corrida como origem disto. O facto de me custar a sair da cama e a acordar é outro sinal.

Simplesmente não consigo correr livre, leve, com a sensação de “mola” nas pernas. O cansaço também não envolve músculos doridos, só uma moínha mais profunda, como quando temos gripe.

Plano para os próximos dias passa por eliminar os factores que podem estar a precipitar isto. Tenho de dormir mais, muito mais e comer melhor, cortar completamente as cervejas ao fim do dia. Também coincidiu, este cansaço, com um descarrilar dos meus hábitos por causa do pós-transvulcânia.

Carlos Lopes

Carlos Lopes, 1984, medalha de ouro em LA.

lopes

Eu era miúdo e na altura não apreciei devidamente o feito, embora tivesse ficado contente, como todo o país ficou. O The Lore of Running, de Tim Noakes tem um capítulo dedicado a corredores extraordinários que marcaram a história da corrida. E entre os extaordinários está Carlos Lopes, o homem que deu a Portugal a sua primeira medalha de ouro olímpica.

O que o tornou especial? Primeiro, a idade para vencedor e recordista olímpico: 37 anos e isto em 1984. O seu recorde só foi batido em 2008 em Pequim. Mas o mais extraordinário nele era a forma como geria a sua forma para alcancar um pico fulgurante para uma corrida em específico. Antes desta maratona Olímpica, Carlos Lopes desistiu de uma maratona em que ia no pelotão da frente, ao km 29. A resposta dele, mais tarde, foi que já sabia que estava em forma, fora um teste e não quis cansar-se mais.

Tim Noakes dá mais exemplos dessa gestão de Carlos Lopes que parecia ter um instinto perfeito em perceber o que o seu corpo precisava: mais descanso, mais corrida, mais velocidade e o tipo de testes para construir a sua confiança.

burnout, overtraining

O cansaço que sinto agora é absurdo. Corri 50km no fim de semana com um back to back longo, 21 com desnível e 30 assim assim em cidade, mas não justifica ter dificuldades em sair da cama sequer ou agachar-me para apanhar qualquer coisa. Brincar com a minha filha torna-se penoso. Tenho de andar de gatas, construir torres de lego ou entrar na tenda dos bichos e todos os movimentos me custam.

O cansaço vem de antes. No sábado passado, aquele meu treino abortado foi um sinal claro de que não estava bem, porque até hoje nunca desisti de um treino assim. Ao primeiro km só queria voltar para o carro e não, os 35º ou 36º não justificam de todo. As minhas pernas pesavam chumbo. Arrastei-me mais 20km.

Desde a Transvulcania, nunca mais fui o mesmo. Tinha previsto descansar um mês, mas estive agora a ver o meu calendário de treinos e fiz muitos quilómetros de bicicleta.

Li isto ontem, no excelente Lore Of Running do Tim Noakes, um livro extremamente sólido, um clássico:

Transcrevo aqui página 664

once you have completed the ultramarathon race to your satifaction, it is time for a good rest. I suggest that for thee months you should do little or no running but concentrate on other non-weight-bearing function of your leg muscles to recover. Once that has happened and your legs again feel light and springy you can cnsider returning to running training (…) these findings explain why you should not expect to run comfortably for a long time after the ultramarathon (…) As a result of the damage caused by the ultramarathon, I would suggest that if you wish to specialize as an ultramarathon runner, you should race only once each year or perhaps, even better, only every second year at the ultramarathon distance. (…) If on the other hand you are an occasional ultramarathon runner, I would suggest that you only run one such race every second or third year. Finally , the advice I would have liked to receive when I was running ultramarathons is to alternate one year of running with one year of triathlon training.”

Também recomendo este artigo muito interessante (e longo): Running on Empty
Over the past decade, ultrarunning has gone from a fringe pursuit for distance freaks to a hypercompetitive sport attracting big-time sponsors. But a mysterious training condition is suddenly plaguing its ranks, robbing a generation of top athletes of their talents and forcing victims to wonder: Is it possible to love this sport too much?

Outro que partilharam comigo: As Ultramarathoning Grows, Overtraining Syndrome Looms.

Isto deu-me que pensar. Claro que eu não sou elite e não treino os volumes dos elites, mas na Transvulcania dei mesmo tudo o que tinha e o facto agora é que estou mesmo muito cansado, mesmo com volumes muito baixos. No sábado senti-me cansado no km 1 e isto quando já não corria há 5 dias.

Aquilo que identificava como problemas de disciplina e motivação e que me estavam a massacrar, podem estar muito mais relacionados com o meu corpo a dizer “chega” do que propriamente com a minha mente ou falta de força de vontade.

Tenho a Ultra Douro Paiva daqui a poucas semanas e vou na mesma, nem que tenha só de descansar até lá e quando lá for vou passear.

hidratação, electrólitos e hidratos de carbono e comida dos abastecimentos

A santa trinidade durante uma prova. O meu conselho é o de separar o mais possível estas três variáveis: gel para hc (ou outra fonte de hc como o Perpetuem que eu uso em ultras), cápsulas de electrólitos e água pura. Não sou nada fã de isotónico, a não ser que exista uma fonte de isotónico e outra de água (2 garrafas) ou que se possa diluir misturas ou concentrar durante uma prova.

As condições de uma corrida e as necessidades do nosso corpo não são uma ciência exacta e acho melhor ter liberdade para agir em 3 frentes. Por exemplo, num dia muito frio, ter a energia misturada com  água pode significar o desastre, pois podemos não ter energia suficiente por não ter sede e não beber. Num dia muito quente precisamos de mais água, mas se ela tiver coisas como electrólitos ou hidratos, vamos consumir demasiado e ter problemas.

Já cheguei a usar pastilhas efervescentes com electrólitos (e zero kcal) e o que acontecia era o corpo começar a enjoar do sabor (fosse qual fosse) e pedir água pura. Se tivesse 1.5L de água com sódio e sabor às costas era o desastre. Bebia e ficava com mais sede.

As cápsulas de electrólitos, nem lhes sinto o sabor e isso é bom quando há enjoos. No calor podemos consumir sódio, potássio etc. minimizando o risco de vomitar. Por um lado é mau porque sem sentir o sabor, não temos qualquer feedback instintivo que diz “é demasiado salgado” ou “preciso de mais sal”. Não noto qualquer diferença entre as cápsulas normais e a versão extrema que tem muito mais sódio.

Outro problema acontece quando temos problemas digestivos, especialmente prováveis em calor. Ter formas de diluir sabores de HC ou de só beber água pura até passar, são essenciais.

Eu começo sempre com perpetuem e gel, mas às vezes há alimentos que nos salvam. Na transvulcania foi a melancia. Comi toneladas de melancia fresca, sumarenta. A melancia é basicamente água. Também gosto de cubos de marmelada, passados por sal. Coca-cola, litros. Tem cafeína e açúcar. É preciso que o alimento em questão nos apeteça mesmo e reconforte, mas convém não exagerar. Quanto mais sólido, em princípio, pior.

Nunca toco em laranjas, a acidez dá cabo de mim. Nunca como pão ou batatas fritas. Nem esparguete (já tentei uma vez) ou seja o que for mais sólido. Só se estiver a morrer de “fome” e o estômago precisar de aconchego, o que será certamente o caso em ultras muito longas. Aí acho que o ideal seria uma sopa à lavrador, uma bifana com mostarda… estou com fome.

back to back to the future

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Penso que cumpri o pico, embora não com o desnível que queria. Hoje poderia ter treinado trail, mas tive um impulso logo às 8:00, sair porta fora e correr de manhã cedo pela fresca.  Na corrida chama-se a isto back to back, correr 2 long runs de seguida. Foram 52km, perto de 7h de corrida com poucas horas de diferença.

Gostei muito de passear pela cidade. Foquei-me mesmo assim no desnível possível. Comecei fresco, depois o calor veio e sofri no fim, bastante. Há um aspecto curioso, costumo terminar as minhas corridas pela zona onde vivo, e passo ou pelo EUL, Campo GRande, Quinta das Conchas etc. e motiva-me sempre ver outras pessoas a fazer a sua corridinha. Chateia-me estar tão rebentado nessas alturas. Tenho saudades de correr estrada e de treinar séries ou treshold runs no EUL e Campo GRande passar a 4:00 (ok para mim é muito) por corredores que parece que vão parados e que se calhar imaginam que eu corro assim o tempo todo e que não fico dobrado em dois a ofegar até começar a próxima série.

É também absurdo quão lento o cansaço nos torna. A minha preparação para Málaga fez-se com os easy runs a 5:30. Aqui  lutei para fazer splits abaixo de 6:00 em plano. Tenho a desculpa de ontem ter sido um treino duro.

Gostava de não sentir pressão ou angústia. Eu sei que serei finisher do UDP a não ser que tenha um problema grave, mas o treino de ontem abriu-me os olhos. Se sentisse algo assim aos 10 ou 20km duvido que aguentasse mais 40km naquele estado, nem era recomendável. Não era só cansaço, envolvia enxaqueca, arrepios, quebras de tensão que não se deviam a hipoglicemia. Mas duvido que sinta, pois estarei mais repousado nessa altura e certamente não vou jantar fora, beber vinho e 2 uisques de véspera.

Já sei como sou. Se vir alguém à minha frente, vou querer passá-lo. Não vou gostar que me passem. Posso ir passear quando quiser. Se vou correr, vou para fazer a melhor prova possível nem que me mate.

STE abortado

Vergonha :\ Foi a primeira vez que desisti de um treino e o encurtei face ao que tinha planeado, mas quando comecei a sentir tonturas, quebras de tensão e arrepios de frio achei que era melhor. Vim para Sintra armado em guloso a querer fazer 44km +2200m (STE) de pico para os 60km do Douro Paiva.  Comecei a correr às 15h estavam 35º à saída do carro. Percebi logo que era impossível fazer os 44km que já fiz antes. A água escorria-me da cara para o chão. Reduzi para 24km e acabei por fazer 21km +1050m em 3h54m, com paragens para ofegar e andar. Devo ter bebido uns 4 litros e meio, electrólitos e energia, mas o estômago chegou a um ponto que puf. O calor não explica tudo. Ontem jantar, vinho, 2 uisques + virose da minha filha e pelos vistos os 60km de bicicleta semanais cansam. Também devo ter cansaço da Transvulcania.

treino

a importância do Strava

tenho-me massacrado demais, apesar de toda a minha indisciplina (Tigre ! tenho de ser mais Tigre)  a verdade é que faço uns 60km por semana de bicicleta registado e neste fim de semana planeio fazer dois treinos de pico que podem atirar esta semana para os 80km de corrida.

Bati o meu pr na volta ao EUL por larga margem num dia de muito vento e depois de uma viagem de carro de ida e volta ao Porto. Não me posso massacrar demais.

Eu gosto do Strava porque ele me motiva. Na prática, se nao estiver a treinar estrada em que os tempos contam muito, só o Strava me confere um contexto motivacional interessante. Bater os meus tempos, bater os tempos dos outros, nos segmentos.

Por exemplo hoje, com vento contrário muito hostil, bati o meu RP num segmento que faço centenas de vezes, a Rua da Palma Portugália, 4’23”, lugar 60 em 393 ciclistas que registaram o tempo. E isto numa bicicleta de roda 16 com 2 alforges carregados (o tripé fotográfico chegou ao trabalho) e roupa de escritório.

Ainda na 2ª feira bati o meu recorde num percurso que faço desde 2013.

Estou uma besta e sinto-me cansado, entorpecido. Só Strava me lembra que não estou assim tão mal. Por isso gosto dele.

tigre, leão, garuda, dragão

budist

O livro do lama tibetano Skyong Miphanm, “running with the mind of meditation” apresenta quatro figuras do budismo dos himalaias e relaciona-as com a corrida. Representam qualidades que os bodhisatvas devem desenvolver no caminho para a iluminação.

Elas funcionam um pouco por etapas, embora a passagem para uma etapa seguinte não signifique uma transformação, deixando para trás a etapa anterior, mas sim uma convivência com a mesma.

No livro, cada uma é analisada detalhadamente, com sub-capítulos. Deixo aqui um resumo muito superficial e sofrido, pois as coisas na cultura asiática nunca são lineares como as nossas cabeças ocidentais gostam e as informações são frequentemente contraditórias consoante as fontes consultadas.

A primeira é o Tigre.

tiger

O tigre representa a confiança ou consciência que se atinge pela prática. Na corrida é a fase em que estabelecemos as bases de disciplina e um novo conhecimento de nós próprios. Descobrimos coisas que não sabíamos que existiam em nós, por exemplo, que conseguimos correr sem ficar ofegantes.É uma fase que exige dedicação e humildade, prática. Na meditação, é sermos capazes de nos concentrarmos apenas na respiração e ter a prática de meditar regularmente, da boa postura, de sermos capazes de ficar parados. Na corrida, focamo-nos em detalhes como a passada, a postura, a respiração, o ritmo cardíaco. Aprendemos. A transformação em tigre ocorre quando correr se torna natural  Muita gente que diz não gostar de correr, normalmente não chegou a tigre, como eu na meditação, em que 10 minutos quieto a respirar me parecem intermináveis, um suplício, e em que não consigo estar mais de 5 segundo sem ruído mental. Mas mesmo os que gostam e estão na fase leão, garuda ou dragão, precisam de ser tigres sempre. É a base.

Eu lido diariamente com os desafios do tigre após cada prova completada e pausa, ou lesão. Recomeçar a base, até ser tigre de novo, é sempre o mais complicado para mim. E vocês?

A segunda é a do leão das neves.

lion

É associada a felicidade e exuberância. Já gostamos de correr, não é só um sacrifício. Começamos a ter consciência do que nos rodeia, podemos apreciar uma paisagem, uma serra, a companhia, uma cidade, uma rua. Estamos receptivos, alertas, observadores. Penso que praticamente todos os trail runners, por exemplo, são corredores que chegaram à fase leão.

Comecei por ver a corrida como um meio para ser saudável, ou perder peso para poder fazer ciclismo melhor, mas à medida que me transformava em tigre, passei a ver o leão e a preferir passear pela cidade em long runs, em querer descobrir ruas novas, cidades novas em maratonas e finalmente a natureza pelo trail. E vocês?

A terceira é o garuda.

garuda

A garuda nasce e assim que nasce pode voar para todas as direcções. É associada ao poder ilimitado da mente na meditação. Na corrida é a fase em que nos metemos em desafios que obrigam a uma superação , embora, claro, com uma dose de realismo, não é irreflectida. É a fase em que nos inscrevemos numa distância maior, numa corrida diferente, fora da nossa zona de conforto, ou colocamos um objectivo de tempo ambicioso. Ninguém nos pára. Esta exige uma motivação de fundo, maior, uma razão.

Podia pensar que sou um garuda inato, por me ter metido em objectivos tão ambiciosos em pouco tempo, mas a verdade é que senti que quase perdi o Leão, a alegria e exuberância, em desafios demasiado difíceis ou com lesões por treinar demais. Às vezes o lado inconsciente pode levar-nos a desmotivação e desaires. Alguma vez sentiram isso?

A última é o dragão.

dragon

O dragão é símbolo de sabedoria, omnisciência, inteligência, de poder gentil, de generosidade. É misterioso e surge sempre perto de nuvens, no céu. Já não corremos para nós, mas para os outros, já não é só para o nosso prazer e alegria, mas pelo prazer e alegria dos outros.

Eu ao ler isto pensei imediatamente na Rosa Mota e no Scott Jureck, como dois atletas que foram os melhores do mundo e que agora continuam a correr com alegria e generosidade. A Rosa Mota é sempre vista em corridas, por causas e está sempre sorridente e feliz. Mas continua tigre, a correr, a treinar, para o poder fazer.

O Scott na sua biografia, fala no beco aparentemente sem saída em que se viu, a nível de motivação, e como desceu às raízes da corrida, ao esperar por todos os corredores no fim das provas ou ao ser apenas voluntário em provas. E não deixa de ser garuda.
Neste momento está a percorrer as mais de 2 mil milhas do apalachian trail, tentando um recorde.

E pronto, foi a minha tentativa, espero não ter simplificado demais.

Vrrm vrrm

treino

O meu teste costuma ser a volta ao EUL. Hoje num run de 8km bati o meu PR por 10 segundos (e fiz a minha milha mais rápida também) e estava um vento contra terrível nas partes mais expostas da pista!

O lado negativo: ia morrendo. Acho que nunca fui tão em anaeróbio tanto tempo. Já não ando com monitor cardíaco (a minha empregada escondeu-mo). Acabei dobrado em dois e com o estômago num nó. Depois fomos correr para casa comprar frango.

fim de semana de carrinho

Penso já ter desenvolvido a técnica ideal de corrida com bebé / crianço pequeno. O truque é sincronizar a corrida com o período de sesta matutina ou vespertina. O meu exemplar já não dorme sesta de manhã habitualmente, mas fica sonolento. Se tiver oportunidade para isso, como num automóvel em viagem, ou num carrinho de jogging, dorme ferrada, depois de uns bons 20-30 minutos atenta à paisagem.
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Quando adormece, temos perto de 60 minutos livres.

j

Grande tempestade hoje, felizmente a parte pior foi quando faltavam apenas 3km para chegar ao carro, perto do padrão dos descobrimentos. Muito vento, muita chuva. Rio acima fui a voar (bati inclusive alguns PRs) ao sabor do vento e misturei-me com uma prova de 10k que estava a decorrer em estrada. Mas para voltar foi duro.

Às tantas a apaneas 1km do carro J acordou e queria andar. Eu disse-lhe “está a chover demais!” e ela não acreditou, tive de a tirar do carrinho. Foi suficiente para a convencer a refugiar-se lá outra vez.